No dia 19 de agosto comemora-se o dia mundial da fotografia, ferramenta fundamental para o registro imagético da nossa sociedade. Se, por um lado, a fotografia é protagonista nos diálogos que envolvem arquitetura e cidade, retratando momentos históricos e valorizando os edifícios, por outro, ela também consegue nos guiar pelo contexto e bastidores do momento, eternizando o processo.
A primeira imagem gravada em uma folha de papel foi produzida por Joseph Nicéphore Niepce, um inventor francês nascido em 1765 que se interessou pelos ensinamentos de Leonardo Da Vinci a respeito dos métodos e efeitos da câmara escura. No começo do século XIX, depois de vários pintores e desenhistas usarem da imagem invertida fruto da câmara escura para reproduzir a realidade em seus desenhos, as invenções e descobertas relacionadas com a Revolução Industrial possibilitaram que se fixasse, em papel ou em metal, uma imagem projetada a partir dessa ferramenta. No início do século XIX, usando uma caixa de madeira apontada para o jardim e um papel tratado quimicamente, Niepce conseguiu imprimir a imagem de seu quintal na folha, resultando no que se considera ser a primeira fotografia da história — que tinha como objeto principal a arquitetura de um jardim residencial.
A técnica se aprimorou no decorrer dos séculos XIX e XX quando as impressões começaram a ser feitas em papel fotográfico e a tecnologia do aparelho também evoluiu. Com o século XXI, a fotografia impressa caiu em desuso para enfim chegarmos na era digital, com as câmeras digitais e os celulares. Com sua popularização, a fotografia passou a ser uma ferramenta tanto para registrar momentos icônicos familiares e grandes cenas históricas, como meio de eternizar o banal, o cotidiano e o contexto, tornando-se um objeto quase investigativo do passado, o que é visto também pela história da arquitetura. Para além do registro dos grandes edifícios enquanto objetos e obras de arte a serem admirados, a fotografia conseguiu registrar também os processos construtivos de obras emblemáticas.
O Empire State Building, por exemplo, tem sua construção iniciada em 1930 em Nova York, marcando um avanço fundamental na arquitetura a partir do uso do concreto e do aço que, combinados, permitiram às construções crescerem verticalmente, dando início a um novo processo mundial de adensamento das cidades. Sob a orientação do escritório de arquitetura Shreve, Lamb & Harmon Associates e da construtora Starrett Bros. & Eken, a estrutura subiu a um ritmo de 4,5 andares por semana, finalizando os 102 pavimentos em apenas 1 ano e 45 dias de obras. O fotógrafo e sociólogo Lewis Hine registrou o processo de construção do Empire State em icônicas fotografias que mostram os riscos que essa técnica traria para a construção civil desde então.
A partir dos anos 1940 a arquitetura moderna se consagrou mundialmente com nomes como Le Corbusier, Mies Van der Rohe e Frank Lloyd Wright. A construção de Brasília, no fim dos anos 1950, mostrou o uso do concreto armado em formas nunca antes vistas. Com um canteiro de obras literalmente do tamanho de uma cidade, o odisséia atraiu trabalhadores de todo o país para uma região remota, criando aglomerados urbanos que mais tarde se tornariam as conhecidas cidades satélites. O fotógrafo franco-brasileiro Marcel Gautherot capturou em imagens o grande canteiro de obras desse período, registrando a imensidão do desafio de construir uma cidade inteira em 4 anos.
Ao mesmo tempo que a fotografia de Gautherot registou a arquitetura moderna sendo literalmente construída, outras fotografias marcam aquele que seria considerado o seu fim. Projetado por Minoru Yamasaki, o emblemático conjunto habitacional Pruitt-Igoe é considerado um marco da arquitetura modernista: com quase 3.000 unidades, o projeto pretendia atender quase metade do déficit habitacional sinalizado pelo poder público na década de 1950 em St. Louis, nos Estados Unidos. O declínio do projeto começa já após a conclusão das obras, em 1955, e menos de 20 anos depois, em julho de 1972, era finalizada a primeira etapa de demolição do conjunto, amplamente registrada em vídeos e em fotografias.
O desenvolvimento da tecnologia digital vinculada à arquitetura a partir do pós-modernismo dos anos 1980 impacta também na forma de construir e nos canteiros de obra. Durante o começo dos anos 2000, o fotógrafo Iwan Baan registrou o que seria esse canteiro de obras mais racionalizado no projeto da CCTV em Pequim, China, concebido pelo OMA de Rem Koolhaas. Além das fotos do canteiro, Baan também registra em imagens o impacto do edifício em seu entorno, destacando o contraste existente entre a escala da CCTV e toda sua tecnologia e as pequenas casas da vizinhança.
A partir das imagens de Baan, Gautherot, Hine e tantos outros, percebemos o potencial da fotografia para além do registro descritivo; eles nos mostram como a fotografia informa e provoca debates, podendo fomentar reflexões a respeito de seus objetos e momentos históricos.
